Papo de Rainhas & Reis com Cacau Protássio

Nossa coluna entrevistou a atriz Cacau Protássio, que é uma apaixonada por carnaval e aproveitou esse espaço para contar um pouco da sua história no samba e também falar sobre a pluralidade dos corpos na folia carnavalesca.
Como começou a sua relação com o carnaval?
Cacau Protásio: Minha relação com o carnaval é algo que vem de berço, a minha família ama o Carnaval e desde pequena eu já via toda aquela movimentação para ir as quadras, desfiles, blocos, ficávamos ligados em todas as matérias que apareciam na TV, esperávamos as vinhetas, comprávamos os CD com os sambas-enredos. Aquela ansiedade para saber como iria ser a pintura da Globeleza. Posso dizer que vivi o Carnaval desde que nasci.
Eu lembro que minha mãe, meu tio Gelson e eu íamos para Sapucaí assistir os desfiles no setor 1. A gente levava almofadinha para sentar, levávamos lanche e era uma festa aquilo tudo. Imagina uma criança de 4 anos vendo aqueles carros alegóricos, um festival de brilho.
Só para você ter noção de quanto tempo faz que eu vivo a magia do Carnaval, quando eu comecei a ir a arquibancada não era nem de concreto, a RioTour montava.
Mesmo muito pequena eu amava o Carnaval, eu tinha todos os sambas na ponta da língua.
Eu lembro do setor 1 com alegria, tenho saudades daquela época, eu vivi um Carnaval raiz.

Já desfila no carnaval carioca há quantos anos?
Cacau Protásio: Com 10 anos de idade eu comecei a desfilar no Salgueiro. Minha tinha Penha que já faleceu, ela era salgueirenseroxa e trabalhava no Salgueiro, ela chegou a me levar para trabalhar lá também. E a partir daí eu passei a desfilar na ala da comunidade, eu era a cabrocha do Salgueiro.
Mas o meu tio era Mangueirense, eu me dividia entre as duas agremiações, tinha amor pelas duas escolas.
Mas o Salgueiro sempre fez o meu coração bater mais acelerado, foi a primeira escola que eu desfilei, eu ia todos os sábados aos ensaios, as sextas-feiras tinha pagode, funk e eu ia também.
Eu era assídua na quadra do Salgueiro, era extensão da minha casa.
Eu era da época de Miro Garcia, Elisabeth Nunes, a porta-bandeira era a Taninha, o mestre-sala era o Vanderlei, também vi bailar o casal Elcio Pv e Dóris. Esta era a minha época de Salgueiro.
Qual a sua escola do coração? Hoje ainda existe essa questão, ou somente torcemos para a escola que defendemos?
Cacau Protásio: Eu amo e respeito todas as escolas. Eu sou uma mulher do povo e jamais deixaria de admirar o trabalho executado pelo povo do Carnaval. É um ano inteiro de entrega, de renúncias, enfrentando obstáculos para fazer este grande espetáculo. Muitas vezes sem nenhum tipo de remuneração, reconhecimento ou ganhando quase nada. Existe ali muita entrega, muito amor e isso começa lá nos barracões, passa pelas quadras e chega até a Intendente, Sapucaí. Então, eu sempre torço para tudo dar certo para todas as escolas.
Mas o meu coração é vermelho, branco e azul. Além do Salgueiro que é uma paixão familiar, que vem de gerações, eu também amo a União da Ilha.
A União da Ilha é uma escola que me acolheu, que me recebeu de braços abertos. No ano do enredo “É Brinquedo, É Brincadeira, A Ilha Vai Levantar Poeira”, em 2014, eles me convidaram para desfilar como Cinderela em um carro alegórico. Eu fui tão bem recebida, tão respeitada, eu me senti tão amada pela comunidade que foi impossível não nutrir um carinho por eles. Eu vou aos ensaios na Ilha, desfilo lá também.
Tenho grandes momentos na União da Ilha, um deles foi em 2022,no enredo “O vendedor de orações”, quando eu vim na comissão de frente representando Nossa Senhora Aparecida, uma santa que tenho uma enorme devoção.

Como foi a chegada do convite para ser musa?
Cacau Protásio: Eu fiquei um tempo afastada do samba porque eu estava me dedicando aos estudos, eu não conseguia me organizar para estudar e viver o carnaval, tenho TDAH e muitas vezes preciso focar muito em uma coisa para alcançar meus objetivos.
Então, só depois que a minha carreira de atriz se estabilizou que voltei a viver o Carnaval, a convite do presidente André Vaz que é meu amigo de infância voltei para o Salgueiro.
Ano passado o André Vaz me convidou para vir no carro e eu disse a ele que gostava de vir no chão, que gosto de sentir a energia do público mais de perto. Então ele disse que me colocaria como musa. E o irmão dele, o Adriano, que também é meu amigo de infância, deu um mega apoio para esta ideia. E eu aceitei o convite e me senti lisonjeada, porque eu sempre fui salgueirense, eu sempre estive ali com cargo ou sem cargo, a maior parte da minha família também. Ou seja, é um amor que vem de berço.
E fico feliz de ter ocupado este lugar sem prejudicar ninguém. Quando eu era mais nova queria ser passista, queria ser rainha de bateria, hoje não tenho mais esta vontade, é uma função que requer muita entrega, dedicação.
Também já quis ser porta-bandeira por causa da Dóris, eu a achava uma negra linda, elegante, ela usava um salto alto que só Jesus!
Mas hoje eu estou no lugar onde eu acredito que mereço estar e que consigo cumprir com todos os deveres e obrigações de musa.
E está sendo gostoso demais viver tudo isso aos 49 anos de idade. Eu estou muito feliz!
O que acha sobre os estereótipos criados sobre os corpos perfeitos no carnaval?
Cacau Protásio: Este negócio de estereótipos ainda é um tabu, é algo que ainda está impregnado em muitas pessoas, esta busca incessante por beleza, corpos perfeitos.
As pessoas têm dificuldades de aceitar os corpos como eles são, um corpo diferente daquele que é imposto pelo mercado publicitário.
Este mercado impôs que a beleza está somente na mulher branca, do manequim 36/38.
Só que cada mulher carrega consigo seu charme, sua beleza, seu encanto, independentemente da cor ou tipo físico.
Meu sonho é ver uma rainha de bateria, uma rainha do carnaval gorda que entregue muita alegria e samba no pé. Gostaria de ver uma mulher acima do peso conquistando este espaço por méritos. Eu sei que temos boas representantes e elas só precisam de uma oportunidade para mostrar que são mulheres incríveis.
Eu fiquei triste quando vi que a Geórgia Chagas concorreu para fazer parte da Corte do Carnaval Carioca e não ganhou. Eu achei que ela entregou samba no pé, carisma, alegria, uma boa comunicação, era uma representante legítima da mulher real.
Vale ressaltar que não estou aqui desmerecendo as demais, só acho que pode ter espaço para todas.

Acha que há hoje um movimento para que sejam valorizados os corpos reais no carnaval?
Cacau Protásio: Sim, eu percebo que existe uma galera que levanta esta bandeira, porque o que de fato importa é a alegria, é a entrega, é a valorização da ancestralidade, o respeito por quem construiu tudo isso que podemos vivenciar hoje.
O que espera para 2025? Vai continuar como musa do Salgueiro?
Cacau Protásio: Sempre torço para o Carnaval do ano seguinte ser melhor do que o anterior para todos nós que somos apaixonados por esta grande festa.
Em relação a mim, seguirei como musa no Salgueiro, pretendo voltar a fazer aulas de samba, estou no processo de emagrecimento e vou voltar a treinar com a supervisão de um profissional de educação física, o que vai possibilitar uma melhor desenvoltura na Sapucaí. Agora com o aumento do tempo de desfile eu preciso melhorar meu condicionamento físico. Quero sambar muito, cantar, mandar beijo e terminar o desfile bem-disposta, feliz, assim como foi este ano de 2024.
Quero participar dos ensaios de quadra e de rua e me jogar no meio do povo, da minha comunidade.
Carnaval para mim é um momento de muita alegria e união.

Deixe uma mensagem para nossos leitores.
Cacau Protásio: Primeiro quero agradecer a oportunidade de estar aqui contando um pouco da minha história de amor com o Carnaval.
Quero aproveitar para parabenizar o trabalho de vocês que sem nenhum tipo de remuneração se dedicam ao carnaval de corpo e alma o ano inteiro, dando oportunidade aos verdadeiros artistas desta grande festa, pessoas importantíssimas que muitas vezes não têm espaço na mídia tradicional.
O recado que eu gostaria de deixar aos leitores é que pudéssemos ter mais amor, empatia e respeito pelo próximo. Acho que nenhum tipo de preconceito é aceitável, ainda mais no Carnaval. Que possamos ser luz e alegria.
Fonte: Palmer Assessoria
Fotos: Janderson Pires